terça-feira, 31 de agosto de 2010

Fogo

Estamos acostumados (principalmente pessoas da minha geração) a ouvir frases um tanto quanto pesadas com relação ao destino da humanidade e demais seres vivos, incluindo o próprio planeta, como 'o futuro está nas mãos dos jovens', e 'veja a que ponto o mundo chegou'.

Não sei a razão, mas desde a minha adolescência a primeira frase vem à minha cabeça com certa frequência, e eu realmente acabo me sentindo parte de um grupo responsável por tomar alguma atitude decente pelo mundo.

Quanto à segunda frase, ainda me lembro do dia em que estava entrando no condomínio no qual morei em São Paulo até 2006, quando uma moradora reclamava com o porteiro a respeito da situação do mundo: catástrofes, desigualdade, corrupção, violência. Ela citava passagens pertencentes à suas crenças, e acreditava que os eventos negativos que se tornaram corriqueiros eram indícios do fim dos tempos.

Por mais que nunca tenha tido envolvimento com qualquer tipo de grupo que se mobilize para o fim da depredação no mundo - quando era mais novo eu tinha a maior vontade de participar daquelas invasões pacíficas do Greenpeace a navios que caçam baleias; hoje eu sou mais viking, e sou mais a favor da lei de talião com pessoas sem escrúpulos que destroem o planeta por dinheiro ou prazer - eu cresci com um certo idealismo, mesmo sem sair falando para os outros pararem de jogar lixo nas ruas e cousas do gênero.

Sempre tive a consciência de que não vou salvar o mundo (as primeiras coisas que falam quando você ingressa na faculdade de jornalismo: 1. você não vai ficar rico; 2. você não vai salvar o mundo), mas tenho a meta de fazer algo relevante que possa mudar algumas pessoas, e que elas façam o mesmo com mais pessoas, e por aí vai. Não pretendo me tornar um ecochato para aparecer, e sim tentar mobilizar as pessoas para atitudes simples que já ajudem o mundo de alguma maneira.

Sei que há eventos catastróficos que ocorrem no mundo que não necessariamente são causados pelo humano (afinal, a natureza tem seus ciclos, e algumas vezes as mudanças podem causar deformidades no que era comum no ciclo anterior, causando alterações na temperatura, solo, etc), mas a questão vai além das ações da natureza. Aparentemente tudo gira em torno do aquecimento global, e uns jogam a culpa nos outros pelos aumentos graduais da temperatura nos últimos anos, enquanto outros dizem que os atos humanos não interferem tanto nas alterações repentinas que ocorrem no planeta. Mais do que qualquer coisa, as consequências mais discutidas são os impactos que essas alterações trarão às vidas humanas.

Independente de quem está correto, qualquer uma das afirmações quer dizer que o humano interfere na vida dos outros, principalmente na dos que não são humanos. E há pessoas que não veem importância em qualquer uma das constatações, e não só não colaboram com o planeta como conseguem piorar bastante a situação.

Isso acontece em diversos graus: há grandes empresas que, procurando criar boas imagens, dizem que preservam o meio ambiente e tentam contribuir para a inclusão social dos desfavorecidos, enquanto do outro lado permitem vazamentos ou promovem a desigualdade com trabalhos escravos em cantos escondidos do mundo.

No caso desse texto, o exemplo usado não será uma grande empresa, que visa lucros milionários, e sim pessoas quaisqueres, como eu ou quem ler isso.

Hoje, enquanto assistia a um telejornal para realizar as tarefas diárias do trabalho, vi uma matéria aqui da região falando de um incêndio criminoso na rodovia Oswaldo Cruz, que liga Taubaté, no Vale do Paraíba, a Ubatuba, no litoral norte (entre as duas cidades está São Luiz do Paraitinga, onde morei durante três anos).

Muito provavelmente não é criminoso no sentido de que alguém pegou um lança-chamas e incendiou o local para empobrecer um fazendeiro qualquer. Deve ter sido, simplesmente, um imbecil que passava de carro e jogou uma bituca de cigarro no mato seco - não há chuva nessa região há dois meses. O custo dessa queimada estúpida: 400.000 m² (equivalente a mais de 50 campos de futebol, levando em conta um cálculo médio das exigências da Fifa para um campo, 105x70m).

Segundo a reportagem, foram registrados 1.219 focos de incêndio em 2009 nesta região. Faltando quatro meses para o fim de 2010, 1.697 focos já foram registrados nesse ano. Destes, a maioria teria tido início causado pelas típicas ações irresponsáveis, como jogar uma bituca de cigarro no mato ou iniciar um incêndio """""controlado""""", que também é uma atitude babaca, visto que isso empobrece muito o solo, e muitos infelizes fazem isso querendo limpar o espaço para começar a cultivar algo.

O que dá para dizer a essas pessoas? Aliás, muitas delas nem sabem o tremendo prejuízo que causaram à natureza - fauna e flora - e a proprietários dos terrenos queimados, porque só estão de passagem por ali!

Outra notícia de hoje? "Parque (Nacional) das Emas sofre destruição de 90%". O parque, situado no Centro-Oeste, tem 132.000 hectares (usando os mesmos cálculos de antes, isso equivale a quase 180.000 campos de futebol). A destruição de 90% equivale a 118.000 hectares (ISSO EQUIVALE A MAIS DE CENTO E SESSENTA MIL CAMPOS DE FUTEBOL!). O fogo começou em plantios de soja ao redor do parque e se alastrou pelos fortes ventos dos últimos dias.

Para esclarecer um pouco mais (e não deixar a entender que só o equivalente a campos de futebol foi queimado), consultando a Wikipedia encontrei o tópico "Importância do parque". Em resumo, ali era um ponto fundamental para manter características da fauna e flora do Cerrado. Ali tentava-se manter vivo, pelo que contei, 51 espécies da fauna, e 42 da flora. Dentre elas, várias espécies em extinção!

Voltando à matéria do Estadão, dados indicam que a maior parte dos incêndios ocorrem no Cerrado, e que 67% deles começam em áreas privadas, com índios ou fazendeiros imbecis que tentam fazer essa "queimada controlada", e acabam ferrando com tudo. Ou seja: para "cuidarem" de suas terras, eles acabam com centenas de espécies.

Sério, se o mundo estivesse nas mãos da minha geração, eu pediria a liberação do porte de tacos de beisebol para a aplicação de disciplinamentos mais rígidos... no entanto, tem tanta gente da minha idade que ajuda a piorar as coisas que às vezes eu fico é pensando em como o mundo seria mais feliz daqui para frente se todos os humanos sumissem...

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Amizade (nostalgia+post gigante)

"Pode acontecer um monte de merda na minha vida, mas se tem algo de que não posso reclamar é dos amigos que tenho."

O Mineiro (amigo de São Luiz do Paraitinga) falou isso nesse final de semana, enquanto íamos de ônibus à Lagoinha, para passar o dia com o Kannu (nós três tocávamos juntos). Fazia cerca de um mês que eu não via o Mineiro, e acho que uns seis meses que não via o Kannu.

Eu os conheci logo que mudei para São Luiz: o Mineiro trabalhava como chapeiro e sempre deixava um violão guardado embaixo do carrinho de lanches, e depois de conhecê-lo comecei a levar o meu violão também para tocarmos juntos. Para socializar mais fácil, aprendi a tocar uma música da qual nem gostava tanto para tocar com ele e com outro amigo nosso. Alguns meses depois conheci o Kannu, que curtia rock tanto quanto eu, mas que também não sabia tocar tanto - igual a mim e ao Mineiro.

Começamos a tocar juntos e a fazer apresentações pela cidade (restaurantes, festival de inverno, etc), e algum tempo depois resolvemos renomear o grupo e tocar músicas próprias (sendo uma delas a que linkei lá em cima).



Nossa primeira apresentação, no festival de inverno, em julho de 2007




Apresentação num restaurante, provavelmente em 2007 também




Apresentação no festival de inverno de 2008, quando tínhamos um baterista e resolvemos fazer uma apresentação mais rock'n'roll (com direito a gritos, pulos, caras de maus, e eu com camisa aberta no frio)




Acústico que eu e Mineiro fizemos em 2008 durante um evento cultural


Tempos depois, o Mineiro foi embora de São Luiz para morar em Taubaté (que não é longe) e trabalhar em outro lugar. O Kannu começou a tocar em um grupo sertanejo - o grupo já tem um cd gravado e se apresenta em várias cidades - e foi morar em Lagoinha (20 km de SLP), onde os outros membros da banda moram. Com a enchente, também fui embora. Estou abrigado em Taubaté até me formar, e mesmo assim não pude voltar a tocar com o Mineiro por aqui devido às divergências em nossos horários.

Nenhum de nós três conversa diariamente, e às vezes ficamos um bom tempo sem contato. Aí resolvemos tirar um fim de semana para fazer um 'back to the good old times' lá em Lagoinha, aproveitando que estava tendo um rodeio por lá.

No momento em que o Mineiro falou a frase que destaquei lá em cima eu estava segurando o choro. Depois, quando encontramos o Kannu em sua casa, pegamos violões e baixo e começamos a improvisar as músicas. Começamos com 'Born to be wild', mas depois foi a vez de tocar 'Cartas de baralho'. Quando a música terminou, os três estavam com cara de bunda, e começamos a falar da nossa amizade depois de o Kannu ter dito 'já já eu vou chorar se continuar assim'. Até escrevendo essa parte eu quase chorei.

Tem MUITA gente que passa por nossas vidas, com quem temos contato diariamente, e que por mais que haja conversa, troca de ideias, balada, não é criado um vínculo afetivo assim. Esse é o tipo de pessoa de quem você vai lembrar por um tempo, ter saudade de um momento ou outro, e só.

Os outros, de quem você sempre lembra, e eventualmente fica desanimado pela falta que o contato faz, são aqueles que te dão orgulho quando você diz que são 'irmãos'. São aqueles idiotas que marcam algum programa, e que no final das contas só ficaram bebendo juntos num bar qualquer ou ficaram jogando no computador até o amanhecer enquanto falavam de problemas amorosos e de garotas que mexiam conosco. Essa é a parte mais triste de você ver na marra os ciclos da vida de cada um passando, pois é comum que a linha traçada por cada um separe esse grupo e leve cada pessoa a lugares distintos.

Até hoje, por exemplo, dói ao lembrar de quando fui embora de São Paulo. Passei os meus últimos dias lá com os meus amigos, e nunca vou esquecer da última despedida que tive na noite anterior à minha partida. Estava dentro do elevador com o Renan (que passava o dia no meu apartamento, e eventualmente traçava minhas marmitex), e quando chegamos ao andar no qual ele morava, depois de 20 segundos de silêncio, desabamos no choro, parecendo duas criancinhas. Aí a boadrasta dele, que estava com a porta de casa aberta, veio me abraçar também... devia estar achando que éramos malucos. Acho que essa foi a despedida mais triste que já tive.

Tenho outros grandes amigos de lá também, daqueles que ignoram a técnica do 'abraço de homem' (típico de homem que gosta de abraçar quem não é tão amigo, mas que para não se sentir maricas evita mais de um segundo de contato e cousas do gênero). É abraço forte, com tapas, enquanto um xinga o outro dos mais variados e pesados palavrões possíveis.



Renan e eu... isso deve ser em 2004 ou 2005




Johan, Tico, Marcel, Felipe, Renan, e eu capotando




Marcel, eu, Leon, Johan e Tico, quando eu já não morava mais em São Paulo - virei a noite com eles na capital pra viajar de manhã pra Prainha Branca (noite memorável)




Meu primeiro carnaval em São Luiz do Paraitinga, em 2007, com direito a visita do Marcel e Johan


Agora, depois de tantas fotos e legendas nostálgicas, vem o outro lado da coisa: se eu não tivesse ido embora de São Paulo, eu não teria conhecido o Mineiro e o Kannu, e ninguém da faculdade em que estudo, e por aí vai. É aí que tá a graça da coisa! Em algum momento devemos partir do local em que estamos, mas ao invés de lamentos e mais lamentos pela distância dessas pessoas queridas, devemos nos contentar por termos ensinado algo a elas e vice-versa no tempo em que estávamos próximos, e por sabermos que poderemos ensinar outras coisas a novas pessoas, e com elas aprendermos algo diferente.

Cada ciclo de nossa vida tem um momento certo para começar e terminar, e a cada mudança devemos ter o coração e a mente abertos para recebermos novas pessoas, e, consequentemente, novos aprendizados.

Então, à quem parte de algum lugar, aproveite os novos lugares e as novas pessoas que conhecerá: a saudade de pessoas vivas não deve ser tão dolorosa, pois, por mais longe que estejam, as pessoas terão uma chance de encontro em algum momento. Na verdade, acho que nem a saudade de pessoas mortas deve ser tão dolorosa. As lembranças aparecem, e com elas o choro, mas acho que o que prevalesce são os momentos que as pessoas tiveram juntos. Tem lugares do mundo onde as pessoas até festejam a morte de alguém! Acho que, na atual conjuntura, não é difícil uma pessoa morta ir a um lugar melhor que o mundo de hoje...

PS: apesar da "proximidade" trazida pela internet, é sacal ficar horas conversando virtualmente com quem você costumava encontrar diariamente. Na maioria das vezes eu prefiro conversar vez ou outra com as pessoas, saber que elas estão vivas e inteiras, e deixar crescer a saudade costumeira de quem vivia décadas antes de inventarem a internet. Prefiro assim, ainda mais quando as pessoas que estão distantes não estão TÃO distantes, e posso encontrá-las a qualquer hora (fórmula do 'qualquer hora': tempo livre + dinheiro - faculdade - trabalho de conclusão de curso - estágio = qualquer hora).

PS2: apesar de fazer menção apenas aos amigos aqui, tudo o que falei aqui é aplicável à minha família, principalmente no quesito saudade, visto que dificilmente consigo vê-la. No caso mamãe+gatos(igualmente da família)+eu, a situação é mais agravante, pois passamos vários anos juntos, acostumados a estarmos juntos, e nos afastamos involuntariamente (enchente fdp).

PS3: eu sou péssimo em demonstrar meus sentimentos pessoalmente, acredito que pela infância anti-social que tive, mas uma hora eu ia ter que falar essas coisas, nem que fosse pela internet.

PS4: acho que já dá pra renomear esse post como 'Bíblia 2: o império contra-ataca'