terça-feira, 19 de abril de 2011

Novo endereço

Resolvi mudar o blog para o Wordpress! Como é possível importar as informações dos blogs, fiz a mudança sem perder postagens/comentários. O novo endereço é www.guerrafelipe.wordpress.com. Agradeço a quem sempre me visitou pelo Blogspot, principalmente os seguidores. Espero encontrá-los por lá também =)

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Bullying

A recente "tragédia do Realengo" levantou uma série de discussões (que acabarei tomando como base para esse e outros posts, já que já fui um "gordinho estranho" da escola), dentre elas os efeitos/consequências do bullying - atos de violência física ou psicológica.

Caso alguém não tenha noção do ocorrido (apesar da estranheza de achar o meu blog e não ter visto uma notícia sequer sobre isso): um rapaz com distúrbios mentais não cuidados (ou não suficientemente cuidados) herdados da mãe entrou em uma escola do Realengo, bairro do Rio de Janeiro, e atirou em várias crianças. Ele teve preparo técnico e material para isso (sabia atirar e carregava speeloaders - acessório que facilita a reposição de balas em armas de tambor, como a clássica .38), e já planejava a ação há tempos. Na hora do ataque ele matou 11 crianças e feriu 18, que foram internadas um pouco depois. Durante a internação mais uma delas morreu. O atirador, ao perceber que não tinha mais jeito de continuar o ato - a polícia tinha acabado de entrar na escola e um militar havia lhe acertado um tiro -, se matou. Nos relatos que deixou (vídeos, carta etc), o rapaz fez diversas menções a vários assuntos - nem todos com sentido e lucidez -, dentre eles o bullying que sofrera naquela escola há anos, e disse que o ato era uma "lição" a muitos.

Acabamos nos perguntando de que maneira o bullying é capaz de estimular uma atrocidade dessas - voltar ao local em que foi alvo de zombaria anos antes para matar pessoas que não conhece, crente de que isso tem sentido. A resposta, apesar de não sabermos bem quão violentado ele era na escola, é que dificilmente a violência escolar (zombaria, contatos físicos) incentivaria isso. É CLARO que, para haver um ato desse tipo é necessário que o responsável tenha algum forte distúrbio, não tenha recebido acompanhamento adequado e tenha encontrado influências e motivações (às vezes pequenas, mas que para ele teriam tido grande efeito). No final das contas, o bullying pode acabar servindo como um motivador para o ato - ele acreditou piamente que teve razão no que fez.

O bullying, obviamente, costuma ter consequências não tão graves assim. Mas ele está em todo lugar desde sempre. No caso das escolas, qualquer estudante ou ex-estudante sabe, certamente, de algum caso da violência - seja como agressor, vítima ou testemunha. A maior característica do ato é a falta de resposta da vítima para com o agressor. Por exemplo, uma criança pode passar anos sendo alvo de zombaria de dezenas e nunca responder a uma das ofensas. Passado algum tempo, a tendência é que ela seja mais introvertida do que outrora, e poderá levar traumas e desenvolver dificuldade para se relacionar com outras pessoas. Há situações drásticas como a ocorrência no Rio de Janeiro, e outras menos graves, que chegam a ser consideradas heroísmo por parte, principalmente, dos que já foram alvos dessa violência um dia.

Por exemplo, divulgaram recentemente imagens de uma ocorrência em uma escola na Austrália na qual um rapaz chamado Richard Gale, magro, acompanhado de vários amigos, resolveu zombar de um garoto, Casey Heynes, o "gordinho estranho". O agressor puxa o outro pelo colarinho e dá um soco, enquanto outras pessoas somente assistem. Na segunda tentativa, a vítima se defendeu do golpe. Nisso, o agressor começa a gingar em posição de luta, como um lutador de boxe. Tentou e simulou mais alguns golpes. Por último, já cheio da situação, o "gordinho" retribuiu a agressão de uma maneira BEM mais forte do que se esperava. O agressor saiu mancando, enquanto outro rapaz, que devia ser amigo de Richard, ficou frente a frente com o "gordinho", provavelmente pensando se arriscaria a sorte.

O "gordinho" virou o herói de milhões nesse instante, e se tornou um dos vídeos "virais" da internet - aqueles que se espalham rapidamente e geram grande repercussão por um período geralmente curto. Basicamente todos os comentários feitos nesses vídeos solidarizam com o rapaz apoiando o ato e desmerecendo o agressor. Na verdade, também fiquei surpreso ao ver o vídeo, e o garoto acabou virando herói também para mim. Mesmo sem saber se a situação era a mais facilmente interpretada - o garoto "normal" que anda em bando caçoando dos "estranhos" -, acabei tendo algum orgulho pelo ato, muito provavelmente por já ter tido vontade de fazer isso quando estava na escola.

À parte sobre o meu caso: eu fui um desses "gordinhos estranhos" na infância e em quase toda a adolescência (não que não seja mais gordinho ou estranho). Some a isso o fato de que no final do ensino fundamental e no ensino médio tive um cabelo bem comprido - ele era bem liso. A princípio, eu não o cortava por preguiça (e por não ligar para aparência), mas com o tempo fui criando zelo pelo cabelo, que era bastante bonito (ele chegou a ter uns 50 cms, até cortá-lo no terceiro colegial). Na sexta série, na época gordinho+branquelo+cabelo raspado, meu apelido para alguns foi Feioso, pelo personagem dA Família Addams. No colegial, enquanto emagrecia e o cabelo crescia, acabei virando Primo Itt, do mesmo seriado (demorei muito tempo para começar a prender o cabelo, então acabaram fazendo a comparação). O primeiro apelido não agradava muito pela palavra também ter tom pejorativo, mas o segundo eu até achava divertido.

Tenho algumas poucas lembranças das caçoadas. Uma vez (lá pela sexta ou sétima série), uma colega de sala chegou em mim demonstrando bastante dúvida perguntando se eu já havia beijado alguma garota. Meu amigo é que acabou respondendo, afirmando algo do tipo "é claro que sim". Outra vez um grupo de garotas, conhecidas na escola não exatamente pela fama de íntegras, me viu passando e me chamou. Não me lembro tão bem, mas foram umas duas ou três perguntas, repetindo um pouco o que a colega perguntou da outra vez, e acrescentando dúvidas quanto a eu ter namorada (obviamente para caçoar). Acabei inventando que namorava uma garota do condomínio em que morava. Lembro de ter ouvido de longe algumas brincadeiras pelo cabelo comprido. O último exemplo é o mais antigo dessas ocorrências, mas é o mais curioso. Na sexta série, após mudar de escola, acabei tendo um colega de sala um pouco desagradável, que geralmente atazanava todo mundo. Ele pegava mais no meu pé, já que era, provavelmente, o mais estranho da turma, e eu não respondia. Ficava quieto, tentava não me preocupar, mas sentia raiva da maneira como ele me tratava certas vezes. No final do ano, já findadas as aulas, um dos meus melhores amigos ligou para mim, e a conversa se resumiu basicamente a isso:

- Falae Felipe, tá sabendo do que aconteceu com o X?
- Não... o que houve?
- Mataram ele quando ele tava saindo da igreja. Teve um tiroteio e ele levou uma bala perdida.

Foi estranho receber a notícia. Pareceu algo do tipo "O cara que te encheu o ano inteiro morreu". Mesmo assim eu não me senti muito bem com o acontecimento, porque independente disso há a convivência costumeira entre colegas de sala, e acaba sendo estranho receber uma notícia dessas sobre alguém com quem você teve contato durante o ano. De qualquer maneira, a mistura de ingenuidade e humor negro daquela época fez passar pela cabeça o pensamento de que, pelo menos, o rapaz não iria mais ficar no meu pé.

Mas meu caso não era grave, porque não era alvo com tanta frequência, então nunca dei muita bola - apesar de isso ainda estar na minha cabeça e, provavelmente, continuar nos próximos anos.


Quanto ao "gordinho estranho" que virou herói, podemos pensar em outros fatores que contribuiram com a situação. No intento de obter mais informações sobre o ocorrido, acabei encontrando vídeos de um programa que recebeu ambos, vítima e agressor, para expor os lados. De um lado, o agressor disse que também sofria bullying (ver alguém tão novo com piercing me faz pensar que, muito provavelmente, ele o tem para chamar a atenção dos outros, meio que querendo parecer ousado - possivelmente sendo respeitado pelos amigos e/ou querendo provar alguma coisa com as atitudes registradas no vídeo). Do outro, a vítima afirmou que o agressor do vídeo caçoava dele havia três anos, e que naquele momento toda aquela raiva acumulou e extravasou. Ele disse também que cogitou se matar.

A psiquiatra Ana Beatriz Silva falou, no programa Altas Horas, que o pensamento suicida, tanto quanto o desejo de vingança (mesmo que indireta, como o recente caso no Rio de Janeiro) não é raro em pessoas extremamente perseguidas e excluídas na escola. Com relação à suposta vingança, o Estadão divulgou recentemente uma matéria baseada numa pesquisa sobre o bullying e atos extremos de violência em escolas (o governo americano analisou 66 casos, ocorridos entre 1966 e 2011). Resumidamente, ela indicou que o bullying motivou 87% desses ataques.

Ana fez um comentário interessante tendo como base a comparação do bullying com o humor. Ela resumiu em "quando é engraçado deve ser para todos. O bullying é engraçado para alguns a troco da humilhação dos outros".

Fala-se também de casos de cyberbullying, que são as agressões e humilhações feitas pela internet, principalmente em mídias sociais (meios de comunicação nos quais informações pessoais podem ser trocadas, como Orkut e Facebook). Pela facilidade e comodidade de divulgar o ódio alheio, os praticantes do ato tendem a criar movimentos nesses meios contra determinada pessoa (por exemplo, criando uma comunidade no Orkut dizendo que a odeia). Outro exemplo provindo do Altas Horas: uma adolescente chamada Isabela conta que sofreu esse tipo de agressão mal sabendo do que se passava (é outra facilidade do agressor: semear a discórdia sem ser notado pela vítima). Há o pensamento do suicídio em comum.

O assunto começou a ser tratado no Altas Horas depois do depoimento despretensioso de um rapaz chamado Felipe, que dizia ser vítima desse tipo de violência desde a quinta série - ele cursava o terceiro colegial na época do depoimento (ou seja, pelo menos sete anos passando por isso). Ele afirmou ter pensado em "loucuras", que provavelmente devem ser, principalmente, relacionadas ao suicídio (e possivelmente a se vingar também, meio que como no caso do Rio de Janeiro, mas é difícil ver esse pensamento prevalescer. Para eles, provavelmente, é muito mais fácil parar de ser vítima se matando do que matando os outros).

Eu não posso dar uma de conselheiro no assunto, mesmo tendo passado por situações desagradáveis, porque o que passei não se compara a esses casos e acabo não sendo um exemplo de superação ou coisa do gênero. De qualquer maneira, arrisco dizer que, além da família, a vítima deve buscar algum tipo de companhia como amparo indireto - ou seja: não ficar procurando gente para mostrar-se como alguém que só tem problemas e que espera somente ajuda do outro. Vivendo na era digital e tecnológica é muito fácil conhecer pessoas de outros lugares que tenham gostos em comum, e, na minha opinião, não há nada melhor do que você tirar algum tempo para conversar/fazer com outra(s) pessoa(s) algo que lhes agrade. Quando se conhece na internet alguém que vale a pena você esquece a questão da barreira física, e vê como há motivos para seguir em frente. Agora sim me usando como exemplo (não necessariamente com internet relacionada): eu, nerd desde criança com o costume de mexer/jogar no computador, sempre me dei bem com determinados jogos, dentre eles os FPS (First-person Shooter, ou jogos de primeira pessoa - aqueles em que você tem a visão do jogo como se estivesse dentro do personagem [e que também viram alvo de polêmicas sobre a influência dos jogos violentos na cabeça das pessoas]). Quando ainda morava em São Paulo, tive minha época de frequentador de lan houses (locais com vários computadores, geralmente com jogos e acesso à internet, que cobram o serviço dos usuários pelo tempo de uso das máquinas) para jogar com outras pessoas que ali estavam, e acabei me tornando conhecido por pequenos grupos de jogadores pelas habilidades ao ponto de ser patrocinado brevemente por uma das lan houses para jogar utilizando seu nome no nickname (apelido). Apesar de não ter orgulho de ser bom em um jogo, nem de ver isso como algo relevante para o mundo, no quesito pessoal era fantástico frequentar os lugares/jogar com os outros e ver como me conheciam e confiavam para exercer a minha função. Para um garoto que não falava muito na escola e muito menos fazia sucesso, eu acaba vendo ali um meio de "ser alguém". Isso acabou me ajudando nos relacionamentos do dia-a-dia, vendo que, independente do que acontecesse na rotina, em algum momento eu poderia ir ao meu reduto e falar com gente que gostava de mim.

É claro que esse exemplo não é tão bom em vários pontos, mas é um meio de mostrar que interesses em comum aproximam as pessoas. Nas escolas há muitas discrepâncias, já que todos estão ali por obrigação e não necessariamente por compartilhar interesses. Por isso, reforço a ideia de que a melhor solução para ter uma válvula de escape para essas irritações da escola é ter um refúgio onde você encontre somente o que gosta - longe da parte do mundo que lhe exclui e humilha.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Experiência

Tenho pensado bastante no que eu lembro da minha infância, desde quando ainda era um pirralho. Um dos pensamentos que sempre me acompanhou, junto aos idealismos dos quais sempre falo, é a vontade de escrever livros.

Quando criança, tinha como certo que iria escrever pelo menos cinco livros. Nunca havia pensado no tema. Com o passar do tempo, comecei a tomar gosto pelo mundo da fantasia, principalmente o relacionado à era medieval – cavaleiros, reis, dragões, magia etc – e sempre fazia o possível para fugir da nossa realidade e chegar um pouco mais perto dessas histórias.

Como sou nerd de jogar computador desde a infância, conheci jogos online ainda cedo, e dentre eles um jogo medieval. Como havia vários servidores, existiam também aqueles nos quais você deveria interpretar como se estivesse mesmo na Era Medieval (podia ser ferreiro, alquimista etc, e falar, se não com um linguajar antigo, com um que não incluísse termos novos).

Acho bem legal a possibilidade de você criar um mundo novo e ter outras pessoas participando disso. Esse tipo de servidor exige bastante criatividade de quem joga, já que cada um deve ter um personagem único, com uma história inserida naquela ambientação inventada pelos “mestres”. E, obviamente, nem se fala na criatividade que os administradores devem ter para cuidar de um mundo novo (atualmente ajudo a administrar um desses servidores).

Com isso, eu sempre penso se não conseguiria criar um mundo paralelo, totalmente diferente do nosso. Talvez ligado a alguma época, como a Era Medieval, ou algo futurista, ou algo em outro planeta (que até dependeria menos de referências históricas) etc. Talvez consiga se fizer um trabalho detalhado e longo, sem a pressa de ter um contexto para escrever algo diferente.

Mas hoje em dia eu tenho interesse sobre muitos outros assuntos, tanto jornalísticos quanto históricos (e eventualmente misturando ficção). Pensando mais pelo lado atual, levo em conta algo que vi no ótimo filme “De encontro com o amor”. O experiente escritor Weldon Parish fala várias vezes ao aspirante Jeremy que um escritor deve ter experiência na vida para escrever algo. De preferência, ter passado por diversas situações para que possa descrevê-las com mais profundidade. Como exemplo, Jeremy não soube descrever muito bem o sentimento de levar um soco no estômago, então Weldon resolveu golpeá-lo para que o jovem entendesse o sentimento daquilo e soubesse descrevê-lo melhor.

Sendo assim, eu vejo a necessidade de você conhecer o mundo para falar um pouco dele. Até para trabalhos totalmente fictícios temos que aproveitar o que se pode associar da realidade nele para que as pessoas consigam se ver nas situações descritas. Por isso, sempre passa pela minha cabeça me meter em lugares inusitados e ficar algum tempo lá para conhecer realidades totalmente diferentes da minha. Morei quase um ano em um seminário sem nem ser cristão, e adorei a experiência. Lógico que não fui morar lá devido a essa curiosidade, e sim por necessidades pós-enchente, mas até passou pela minha cabeça escrever um livro sobre a rotina do local e o catolicismo sob a visão de um agnóstico (é claro que para isso eu deveria estudar bem o assunto).

Aparentemente hoje em dia é facílimo lançar um livro. Findado 2010 eu estava com o meu primeiro livro na mão. É claro que era um projeto experimental, feito como trabalho de conclusão de curso, mas estou tentando lançá-lo (em último caso espalho pela internet, já que é uma relevante memória de São Luiz do Paraitinga). Mesmo com ele pronto, estou lendo e relendo para me assegurar que não haja falhas na escrita nem no conteúdo, e que ele seja realmente interessante.



As facilidades de hoje em dia permitem que (talvez pseudo-)escritores lancem seus trabalhos pela internet, com custo zero ou baixo. Adequando o formato do trabalho ao que essas “gráficas digitais” utilizam, o autor pode enviar o seu arquivo e deixá-lo em exposição no site, para que a empresa imprima somente o que for demandado e fique com parte do lucro. É uma opção para mim também, apesar de algumas empresas trabalharem com um formato de livro pré-determinado (meu livro tem um formato diferenciado). O meu medo é que as pessoas comecem a usar esse sistema sem qualquer pudor para publicar trabalhos sem se dar o trabalho de ter usado criatividade, embasamento, ética etc.

Aproveitando sempre a experiência, creio que poderei um dia escrever trabalhos relevantes à sociedade com o meu pé que fica na realidade. Com o pé que fica em outro mundo (e talvez um pseudônimo), acredito que possa criar universos paralelos e coisas do gênero com os mesmos objetivos que os autores desse gênero costumam ter - reflexão e fascinação. Minha ideia de misturar os dois ainda me assusta um pouco, mas acho que com criatividade e embasamento dá para fazer algo legal. E assim espero chegar à minha meta mínima de livros lançados.

sábado, 15 de janeiro de 2011

Again, and again...

Em janeiro completou um ano que fui embora de São Luiz do Paraitinga. Foi um ano bem corrido, sem dar para respirar muito pensando no que aconteceu na casa em que eu morava e com a vida que eu tinha (a não ser para pautar o meu trabalho de conclusão de curso, relacionado à cidade).

Sem ficar me prendendo muito ao que ocorreu, consegui muitas coisas boas mesmo com as perdas do início do ano. Morando em Taubaté, conseguia dormir melhor, já que não viajava todos os dias, e ter mais tempo para estudar, trabalhar e ter uma vida social mais ampla. Respirei novos ares, conheci gente nova, e consegui inspiração para alguns projetos que não havia amadurecido nos anos anteriores. Mesmo assim eu ainda me sentia unido à cidade em que morava, tanto que sentia quase um dever em deixar algo que contribuísse com a cidade - sentimento que foi convertido no meu livro (que espero conseguir publicar logo).

Quase no Natal visitei a cidade pela última vez para entregar uma cópia em CD do meu trabalho a alguns amigos e colegas. Foi um dia meio triste, pois sabia que minhas visitas à cidade seriam menos frequentes, já que, findado o meu curso na faculdade, eu partiria do Vale do Paraíba. Sendo assim, aproveitei a situação para deixar um "até algum dia" a essas pessoas.

No final do ano, mais precisamente no dia 30 de novembro, fiquei satisfeito com o resultado daqueles meses de trabalho para concluir o TCC. A banca avaliadora, em especial um professor que adora a cidade tema do meu trabalho, ressaltava a minha coragem em retornar lá tantas vezes mesmo depois de ter passado por tudo o que passei. Ele disse não ter tido coragem de retornar lá uma vez sequer desde a tragédia.

É claro que fiquei feliz com o que o professor falou - tanto sobre a questão de enfrentar o lado emocional para produzir um trabalho quanto sobre a relevância do projeto -, mas para mim fica claro que isso é mais poético que real.

Hoje, um ano passado da tragédia, parei para olhar uma sequência de foto das consequências da chuva deste início de ano. Todos os dias há algo novo, mas hoje é que resolvi parar para ver uma sequência de 109 fotos. Na verdade, não sei o por quê de olhar essas fotos. Acho que foi pela curiosidade de descobrir o que eu sentiria ao ver fotos de tragédias do mesmo gênero da que me afetou há um ano.

Em alguns casos a descrição das fotos marcavam, já que nelas é que constavam números de mortos e outros problemas subsequentes. No mais, as imagens não me abalaram. Na verdade eu senti como se fosse possível usar aquelas mesmas fotos no meu trabalho, como se as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo fossem São Luiz do Paraitinga. E aí sim, voltando à São Luiz veio aquela dor por tudo. De entrar em casa e ver tudo de cabeça para baixo (no meu caso vale ressaltar a felicidade de ter cinco gatos sobreviventes), de andar pelas ruas e ver tudo marrom, inclusive o que as pessoas retiravam de suas casas, e de pensar no pavor das pessoas ao se perderem em pensamentos imaginando que suas vidas haviam acabado ali. Sei que, a cada tragédia que acontecer, o mesmo acontecerá nas novas vítimas.

E aí vem o pensamento adicional de tudo o que passei no decorrer do ano ao retornar à cidade e entrevistas as pessoas, de segurar o choro pelas que perderam tudo mas lutavam para recomeçar até os momentos de alegria ao ver que pessoas que eu conhecia estavam se reerguendo.

Eu, meio participante e meio espectador, sempre fui privilegiado por ter tocado a vida, na medida do possível, apesar dos apesares. Mesmo com a minha situação diferenciada, sempre fiz questão de mostrar que São Luiz não era uma cidade coitada, e que ganhara mais foco pelo bem cultural perdido do que por suas pessoas. No meu TCC, eu relatei mês a mês o que aconteceu na cidade, mas sempre apontando acontecimentos nacionais e internacionais graves, como o terremoto no Haiti e as enchentes no Paquistão.

Agora, um ano depois do acontecimento em São Luiz, que só tirou a vida de um homem durante um deslizamento, e de outros eventos que tiraram a vida de muita gente, nós voltamos a ver tragédias em todos os noticiários, como de costume, matando muita gente.

Na verdade nem sei bem por que estou escrevendo isso... depois de tanto tempo focado no TCC, que me prendia a algo que me marcou, pude descansar mais de um mês. Estava querendo escrever aqui, mas estava precisando divagar um pouco para voltar a pensar em outros assuntos, mas é difícil. Tendo passado por situações que lembram as que estão acontecendo atualmente, fico imaginando se as novas vítimas, daqui a um ano, serão tão privilegiadas quanto eu, que recebi apoio incomensurável dos meus amigos e consegui tocar em frente.