segunda-feira, 29 de março de 2010

Ê, seu Zé...

Meu avô, José Corrêa, mais conhecido pelas pessoas como 'Zé Corrêa', já fez um monte de coisas em Laranjal Paulista, onde meu pai e meus irmãos moram. Dentre elas, já foi prefeito e vereador.

Sempre foi uma pessoa rígida, daquelas que deixam o filho de castigo de frente para a televisão desligada quando tirava notas ruins. Não era de convivência fácil, ainda mais quando algo fugia do que estava acostumado a ver. Ele nunca foi chegado nos meus antigos brincos, nem nos meus piercings. Nem nos brincos e piercings do meu irmão Rafael (Fá), e muito menos na tatuagem dele.

Meu contato com ele se resumia a uma ou outra visita nas poucas vezes em que eu podia ir à Laranjal. Geralmente essas visitas coincidiam com o seu aniversário, natal, etc.

Ele sempre perguntava como estava a vida do neto que vivia longe. Dos netos que viviam perto ele sabia. Sempre disse acreditar que o neto jornalista pode e deve mudar as coisas, exercendo o seu papel social.

Independente de quem estava em sua residência durante as visitas, as conversas invariavelmente acabavam em política. Não importava se estava eu, que não entendo tanto de política, com ou sem meu pai e minha boadrasta, políticos da cidade, meu irmão mais novo Victor (Tito), que tende a ser o político dessa geração da família, e o Fá. A política laranjalense sempre acabava em pauta, e às vezes a política nacional, principalmente quando a televisão estava sintonizada em algum canal do tipo TV Senado.

Mais invariavelmente ainda, Seu Zé falava de sua atuação política no município. E não era para menos. Talvez por entender tanto de política, misturado à sua rigidez, ele foi asseguradamente o maior prefeito da cidade. Para se ter noção, ele conseguiu levar a Ajinomoto para a cidade há cerca de 30 anos. Atualmente a cidade tem aproximadamente apenas 27 mil habitantes, e suponho que décadas atrás ela fosse um pouco menor. Para se levar uma indústria do porte da Ajinomoto, não pode ser qualquer político.

Ele era casado com a dona Alice, a avó que chamava o refrigerante Kuat de 'Kuait'. Eles viviam juntos num grande sítio com cachoeira, porém após o falecimento da minha avó o sítio foi vendido. Seu Zé dependia dela, e não conseguiria viver sozinho no sítio, inclusive pelo fato de, após tantos anos casados, vir o sentimento de solidão.

Eu ainda era adolescente quando a vó Alice partiu, e me sentia estranho ao visitar o vô Corrêa em uma casa no centro da cidade, sem ver a vó, e vê-lo não tão sorridente, principalmente quando falava dela.

Ele era uma pessoa difícil de lidar, principalmente com o passar dos anos, levando a família a ficar um pouco afastada dele. Com o tempo, os problemas de saúde foram se agravando. Mesmo com tentativas de aproximação, principalmente para ajudá-lo, havia dificuldade em ficar muito próximo dele.

Nos últimos anos, começaram a vir internações pelos problemas de saúde. No ano passado o visitei com o meu pai e minha boadrasta durante uma internação na Santa Casa. Me senti mal por vê-lo na cama, fraco.

Pouco tempo depois ele voltara para casa um pouco melhor. Aliás, já percebi que nós Corrêas temos sangue ruim, do tipo 'vaso ruim não quebra' mesmo, ainda mais vendo a lucidez que o vô Corrêa teve até os 94 anos, e o vigor que o meu pai tem até hoje.

Quando eu e meus irmãos éramos crianças, reclamávamos demais da rigidez do meu avô, que, consequentemente, levou o meu pai a ser rígido também. Anos depois, os três jovens adultos, independente das situações passadas, reconhecemos que a criação rígida nos ensinou bastante. Certas vezes ela é necessária em variados graus, e não só com os outros, mas muitas vezes com nós mesmos.

De qualquer maneira, fico muito grato de saber que o Seu Zé viveu bem sua vida. Seus 94 anos representam cerca de 20 anos a mais do que a média da expectativa de vida de um brasileiro, e com certeza foi uma vida bem aproveitada, falando em nome de sua vida pessoal e política. Tenho a certeza de que a população de Laranjal Paulista sempre será grata pelo que meu avô fez pela cidade que amava.

Apesar de ter tentado levar o dia normalmente, foi um dia estranho. Minha distração era tamanha que, após o almoço, o prato escapou de minhas mãos durante a lavagem e quebrou. Felizmente o machucado foi insignificante.

No final de 2009 conversei com meu pai, que me sugeriu escrever uma biografia do Seu Zé. Infelizmente não houve tempo para entrevistá-lo, mas espero que haja algo significativo em sua memória, proporcionalmente ao homem que ele foi. Espero que eu mesmo possa fazer algo por ele, mas se por ventura isso não for possível, que alguém o faça.

Bem, não sei se homenagens ou agradecimentos póstumos chegam à pessoa de alguma maneira, então espero que ele saiba da importância que teve para sua família.

E se por acaso você der um jeito de ler isso, obrigado por tudo, vô Corrêa, em nome de sua família.

3 comentários:

  1. Agora entendi porquê vc é um menino tão inteligente !!!
    Vem de família!!!
    Legal vc escrevendo sobre seu avô...
    Faz a biografia dele, tá no teu sangue. rss...
    Beijão, jovem amigo \o/


    ^^

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  2. Parabens alemão pelo texto.
    Vou tentar publicá-lo no jornal aqui.
    E muito obrigado pela parte que me toca...
    Beijos.

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  3. Feeee!

    tá tarde pra comentar nesse port, mas não pra elogiar o texto.

    dá pra sentir orgulho do seu Vô, mesmo sem conhecê-lo..

    " Seus 94 anos representam cerca de 20 anos a mais do que a média da expectativa de vida de um brasileiro, e com certeza foi uma vida bem aproveitada, falando em nome de sua vida pessoal e política."

    Ééé, amigo, é isso que faz a vida da gente valer a pena.


    Beeijo.
    =]

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